O
tempo avança e com tamanha simplicidade faz correr os fatos uns após outros, concatenados
estes, rumando o minuto seguinte. O silêncio de seu quarto parece suspenso do resto
do mundo, distante e diferente da programação muda que segue na televisão que separa o breu do quarto de Rodolfo. Acabam as
notícias tristes, emendam-se os humorísticos e logo a seguir vêm os
comentários do futebol com os gols da rodada e mais uns “quem sabe?” de comentários
e especulações.
Já faz
quase duas horas que o garoto foi para a cama, dentre as quais uns cinquenta minutos
que sua mãe se convencera que ele já dorme e mais uns trinta que dormira ela
mesma. Fora isso, há quinze minutos, percebera Rodolfo que a semana é quase
igual à passada. Ele aguarda a chegada de sua vizinha, abençoadamente desanteciosa,
que costuma chegar tarde da faculdade, sedenta por um banho que lave a canseira
do dia, talvez apenas menos ávida que Rodolfo, que por vezes tem seus dias
salvos por esses banhos de Betsabá.
De sua
janela, estrategicamente dissimulada com sua persiana quase fechada por inteiro, afora por uma fresta na medida do globo ocular, não é possível ver o que se passa no
banheiro de Aline – a vizinha –, mais precisamente embaixo do chuveiro. Ele espera
pacientemente o tempo que leva o banho, somado a uns quantos minutos em que não
sabe o que se passa, embora pense que seja o tempo de esfoliantes ou loções, esquecendo-se
que a jovem da frente tem também suas necessidades fisiológicas por lá, as
quais não detalharemos aqui por ausência demasiada de conveniência, imaginando também
que isso interessaria ainda menos a um menino em plena puberdade. Nem todas as
verdades merecem ser ditas, melhor seria imaginar outras ilusões, tal qual um
menino de quinze anos.
O ciclo
se repete como o próprio Rodolfo reparara. Ela entra em seu quarto e tranca a
porta, pouco se importando com seu espaço de janela aberta, que é pouco, seja
dito, mas que a tudo não esconde. Acende a luz do banheiro, vigiada por Rodolfo
que, de cá, percebe pelo basculante a claridade se espalhar. Desliga sua televisão, sabendo bem, apesar da tenra idade, que o triunfo daquele que vigia está também em se converter em invisível. Ela retorna
rapidamente ao quarto, já sem a blusa, ainda com sua saia longa e seu sutiã que
a cobre. Apaga a luz do quarto e retorna ao banheiro, mais precisamente sua
suíte. Ele percebe, após alguns instantes, uma breve queda de energia pela luz
que se enfraquece e que dura o tempo em que se da o banho, pelo menos são as
conclusões do menino, somado ao vidro embaçado rapidamente e, para constar, não
é preciso ser tão inteligente para saber que ele não estava errado.
Aproxima-se
o momento mais aguardado do dia. Rodolfo o desfruta lentamente, já tem alguma
experiência na cena, como quando desembrulhava seus presentes de criança,
calmamente, na certeza de uma alegria próxima. Ao retornar ao quarto, aparece
mais próxima a sua própria janela, lugar onde talvez esteja sua cômoda onde
guarda sua camisola. Ele a vê da cintura para cima, nunca soube se estaria nua
dali para baixo. Os seios completamente desnudos o hipnotizam, formando uma
paisagem com seus cabelos curtos e bagunçados, poucos centímetros acima dos
ombros. Ali ela fica, meio de lado, meio de frente, com os seios à mostra num
ângulo de quarenta e cinco graus. Está completamente estática e assim permanece alguns longos minutos.
(CONTINUA...)