segunda-feira, 3 de agosto de 2009

Por uma dose de afeto

Já passavam das 11 horas da noite e a casa estava cheia. Era quase sempre assim, nesta época do ano. Muitos de férias ficam além da conta. Outros tantos são os turistas estupefatos e curiosos, sedentos por conhecerem o local e, é claro, consumirem as sensações da droga, embora nenhum usuário lance mão de tal batismo. Afinal, ela não era ilícita; totalmente legalizada. Era o “livre amor”, como enunciavam os amantes orgânicos.
Ela então, adentra a noite. Bem vestida como nunca, insegura como sempre. Há três semanas sem freqüentar a boate, esperava um fôlego novo. Nada. Da última vez em que tomou a dose, jurou que não faria novamente. Alguns diziam que beirava a dependência, outros não necessitavam, e havia os defensores dessa espécie de “embriaguez romântica”. Mas ela sentia culpa. “Posso viver sem isso!”, afirmou imponente.
Alta, magra, loira dos olhos azuis e um nobre par de seios. Percebe a movimentação e a disposição dos corpos. Casais se formam, uns após outros. Tensa, envereda para a pista de dança, na esperança de atrair cobiça. Não queria terminar a noite sozinha. Vai ao bar e bebe uma Cuba Libre. Troca olhares. Nada que lhe envolva. Pensa, resiste. Retorna para a pista. Importunada pelo rapaz, olha em volta. Porém, já não acreditava que conseguiria companhia melhor. “Talvez mereça uma chance”, pensa ela, fatigada por esperar seu príncipe. Novamente no bar, conversam bastante. O bem-sucedido rapaz não lhe suscita nenhum ardor de atração.
Titubeante, não sabe se pede ou não. Mas na esperança incrédula de uma possível descoberta, ela chama o barman e pede: “Uma dose de afeto, por favor...da vermelha!”. Ela bebe e pouco depois, trocam a boate frenética e atraente pela casa do afortunado rapaz.
Num momento de diálogo, após algumas horas de sexo, entorpecida e encantada, ela pergunta:
– Quando nos veremos de novo?
– Talvez no próximo mês. Viajo muito por conta do trabalho.
Desiludida com seus planos de namoro, toma uma decisão antes que seja tarde. Levanta-se, vai ao banheiro e fecha a porta. Enfia o dedo goela abaixo. Repetidas vezes o faz, livrando-se daquela paixão, agora, novamente indesejada. Após dar a descarga, sai do banheiro, pega suas coisas e vai para casa, já pensando em mais um dia de trabalho que a espera pela manhã.

Bruno Costa