quinta-feira, 28 de outubro de 2010

Verdades e ironias

No domingo, talvez o mais sagrado do ano e, quem saberá dos próximos quatro, a freira vota buscando exprimir a essência divina em duas teclas para que se faça conhecer a vontade una e transcendente aos mortais, apontando é claro, para sua dimensão eterna, para a incorruptibilidade do espírito. Seu voto, nos dois sentidos, denuncia a astúcia da carne, ledo engano para o caminho da perdição, da degeneração e aniquilamento da alma. Sua confirmação se da pela e para confissão da natureza pecaminosa dos homens, primeiro passo para expiação dos pecados. Aperta a tecla, aperta ao lado, aperta o verde. Redenção.

O fiel, obediente e temeroso, caminha a mesma vereda trilhada pelo sacerdote contemporâneo. Este último, homem de muita fé, virtuoso e escolhido pelo Senhor para combater o bom combate, a batalha dos séculos, o jogo que não se vê. Enfrenta os olhares e adentra o baixio das bestas para cravar no coração do maligno a espada de fogo celestial. Do púlpito, ele traduz a língua dos anjos e a vontade do Senhor dos Exércitos para o povo escolhido, que sairá dali com a certeza de que aqueles dois números renovarão de esperança uma sociedade entregue aos prazeres da carne e assim ruma para o fogo eterno, mas disso já falamos. Aperta um e depois o outro e o verde em seguida. Vitória.

A jovem pensa que ainda é tempo de viver sob a égide da moral de seus pais e, talvez mesmo a dos pais de seus pais. Tudo para que não entre o mundo em colapso e para que não seja em seus dias a derrocada da vida humana. Não é preciso criar novos valores, eles já lá estão. A família não pode ruir, pois sem ela não teríamos chegado tão longe. A diferença não pode passar assim, levianamente, atacando e ferindo o direito de outros já conquistados. A moral e os bons costumes devem superar o caos. Três toques. Justiça.

Todos que, entre o bem e o mal que se oferecem às vistas, escolhem o bem, para que não chegue o dia em que olhem para trás e digam “estivemos quietos”, apertam os dois números e confirmam. Vida.

Na semana seguinte ao triunfo do domingo pacífico e sangrento, já se contabilizam dezessete jovens espancados, três dos quais não resistiram aos ferimentos, ao longo do território da pátria Brasil. Todos réus confessos da onda fascista e inconsequente que insistem em encarnar: "gays". Ainda com o passar de mais alguns dias, dezoito jovens são encontradas mortas na periferia, carregando em seus corpos o que não poderiam esconder, ainda que tivessem tentado: "mães sem coração". No decorrer do ano, dez jovens ainda seriam presos por atos de terrorismo e vandalismo, desafiando a imprensa em sua liberdade limpa, inocente e neutra em favor da verdade agora e sempre.

O Brasil pôde mais.



Bruno Costa

sexta-feira, 15 de outubro de 2010

Considerações provisórias 2

É impressionante como política na maioria das vezes não interessa ao povo brasileiro.

As pessoas reclamam dos candidatos, mas de fato, poucos refletem ou reclamam de seus próprios atos. A memória dos brasileiros por muitas vezes tem se mostrado bastante curta. Alguém me explica como pode Fernando Collor de Mello quase disputar o 2º turno para o cargo de Governador do estado de Alagoas no ano de 2010? E antes disso... como fora senador do ainda Alagoas? Pior que diante de tudo isso, ainda sim, presenciamos a dificuldade pra validar a Lei do "ficha limpa" as vésperas de uma eleição... afinal, pra que a pressa?!

O eleitor as vezes não compreende que a democracia em exercício, como já dito em post anterior, é não somente o ato de votar, mas também, dentre outras coisas, o acompanhamento do percurso do candidato ao qual fora delegado o “poder” de representatividade. O governo não é do político x ou y apenas. O governo é do povo! Deveria ser de todos! Se o povo não está de acordo com o tipo de governo, ou se as propostas eleitorais não são cumpridas durante o mandato, é o povo quem deve também fiscalizar e ir pras ruas exigir que a política não seja "essa palhaçada” como muitos fazem questão de admitir em alto e bom som. E são esses mesmos, que por muitas vezes nem sequer lembram em quem votaram para os demais cargos que não o de presidente... como então cobrar alguma coisa? Sendo assim, o “circo” é montado e segue seu itinerário levando gargalhadas a fora; de alguma forma tem público cativo, passivo, sempre nas fileiras e cadeiras, atentos, em alguns momentos até aplaudindo. Muitos se distraem com o doce, com a pipoca, com a paquera que está ao lado, com a chuva que segue do lado de fora... enfim, seja qual for o motivo, o particular é sempre mais importante que a cena, ou seja, nesse caso o cenário político.

Muitas pessoas, em especial a comunidade cristã, estão se manifestando contra a candidatura de Dilma Roussef à presidência, baseando-se em algumas questões que tem aparecido no quadro eleitoral já há algumas décadas. Não é com intencionalidade de julgamento que faço esse comentário, apenas sugiro que possamos parar pra pensar o porquê não nos unimos assim para criticar o dinheiro que é desviado da saúde e da educação, por exemplo, ou para defendermos o combate a pobreza, ao preconceito, a segregação, as vozes que são caladas diariamente? Por que não reflitimos sobre essa visibilidade e produção de conhecimento impossibilitada para alguns específicos grupos socias? O que é mostrado na maioria das vezes, geralmente se faz através de uma lente negativa, afirmando a desclassificação, mantida pelo discurso midiático, que por muitas vezes reproduzimos. Mas porque poucos questionam o que afeta o outro, quando a questão não nos afeta? Exitem muitas questões que ferem também os princípios cristãos e que desejariam chamar a mesma atenção que algumas tem chamado nesse último mês. Vamos pensar sobre a pobreza, a educação, a saúde, a falta de amor, a violência, a intolerância, a desigualdade social... seria muito bom se essas coisas nos motivassem a exigir uma posição dos canditados e do governo.

O PSDB agora está preocupado em acusar o PT como “o partido que não gosta da imprensa”, mas o “papel” para o qual a maior parte da mídia atualmente se presa pode se dizer questionável. O Brasil nunca esquecerá a contribuição de uma parte militar, direitista e conservadora do governo/população que calou jornalista e matou seus opositores, numa ditadura que está logo ali atrás... dessa censura não se toca no assunto. O que se discute em relação a censura atualmente é apenas a superficialidade, ninguém quer partilhar a monopólio dos meios de comunicação, preocupam-se apenas se vão poder continuar manipulando e “construindo” o cidadão de modo favorável a manutenção da “ordem”! Pouco se discute democratizar os meios comunicativos e viabilizar a liberdade de expressão, isso não é assunto pra pauta! É importante lembrarmos, como já diria um bom professor de sociologia que conheço, que “a primeira versão é sempre a primeira versão e não o fato”, sendo assim, por vezes, faz bem desconfiar da primeira versão.

As vésperas de um 2º turno, assim como devemos pensar em quem iremos votar, seria interessante pensarmos a nossa atitude enquanto cidadão, a nossa atitude enquanto povo, que acredito ser um povo com muito valor e que muito pode! Nesse sentido eu não desejo a manutenção da ordem... não dessa “ordem” que bem conhecemos! Eu prefiro a dúvida, o questionamento, a transformação! Isso que tanto lutam pra que não possamos conquistar!!

Querem corpos dóceis. Sendo assim... eu prefiro o “caos”.... Bem vindo seja!


Joyce Abbade

quarta-feira, 6 de outubro de 2010

Considerações provisórias

Passados poucos dias desde o domingo “mais importante” do ano, cabem algumas ponderações a respeito de todo processo. Não se preocupem, pois não se trata do que muita se sabe, ou seja, Tiririca, Romário, Garotinho ou outros quaisquer foram eleitos. Azar o nosso, bem sabemos. Tampouco irei reclamar e dizer que tudo será igual e corrupto como sempre. Doravante prossigamos.

Ao ligar a TV vemos propagandas fora e dentro de horas. Nas ruas, panfletos sujam as cidades a cada esquina. Cartazes se espalham. O telefone toca e a voz robótica anuncia as boas novas de tal candidato. Por e-mail você recebe, sem desejar, propostas de um não-contato. Parados, ouvimos os sons de carros com mensagens eleitoreiras. Nos debates quase não se discute conceitos, estruturas, ideias ou ideais. Busca-se vender atrativos e vantagens para cada eleitor e, assim, angariar uns tanto votos mais. Músicas de fundo, crianças e velhos, ônibus e trens, enfim, lugares que não conhecem os quantos candidatos.

Estamos em pleno século XXI, mas ao contrário do que imaginam muitos, o moralismo ainda não foi superado, nem mesmo trocado. Circularam e-mails – estes geralmente enviados por evangélicos, como em todo ano de eleição – espalhavam que certo candidato a vice-presidência seria satanista. Junte-se a isto uma suposta perseguição aos cristãos que, pasmem, serão proibidos de condenar o homossexualismo e em especial sua almejada união conjugal. Ainda, como tática eleitoreira, diminuiu-se a desvantagem percentual ressuscitando fantasmas do passado, como o aborto, por exemplo, que assustaram nossos pais e avós. Porém, “ainda somos os mesmos como nossos pais”, já bem dizia a canção. Não se relacionou este problema à saúde pública, dado que muitas mulheres perdem a vida ou a comprometem por não terem condições de bancar o alto custo de uma clínica clandestina, como algumas outras podem e assim o fazem. Sendo contrário ou favorável, poderíamos ampliar o debate sem demonizar as partes.

Outros tantos eleitores, demasiado fatigados por não verem resultados que se prezem no entra-e-sai dos anos, resolveram dar seu voto à protesto. Talvez tenham esquecido que isso não terá qualquer efeito a que se possa chamar, como o nome merece, “protesto”. Nada sim, é o que irá resultar daí. Outros dirão que independentemente dos que lá estiverem tudo será igualmente ruim; não é necessário muito para saber que não é bem por aí. Basta olhar uns dez anos atrás e ver a situação das universidades públicas, as quais muito mal seguravam professores, quanto menos verbas para uma pesquisa e desenvolvimento acadêmico.

Talvez, nosso grande erro no Brasil seja pensarmos a democracia como apenas representativa e o voto como sua consumação máxima. Eleger alguém não significa suportá-lo “haja o que houver” por quatro anos necessariamente. Podemos cobrá-los, como também participar ativamente da direção política da sociedade que somos. Infelizmente os movimentos sociais são escarnecidos e parece valer mais ter crédito para curtir as delícias do capitalismo via shopping Center. A democracia deve dizer de como queremos ser governados e não apenas por quem.

DEMOKRATÍA, do grego, “governo do povo”.

Bruno Costa