sexta-feira, 23 de abril de 2010

Os Sete Pecados Capitais: VAIDADE

Ela já estava quase pronta, fazendo os últimos ajustes, mas não resistiu. Pela terceira vez, desde a hora em que decidiram jantar fora, ela perguntou se aquela roupa a deixara gorda. Um tanto impaciente, achando a questão impertinente, porém com toda calma e delicadeza, a qual ela confundiria, duvidosa, com indiferença, ele responde o que ela gostaria de ouvir e que era o que ele justamente pensava. Eles saem para mais uma noite comum de sábado, que se findaria com uma também comum cena de sexo. Agora, se foi bom...

Ele acabara de completar 43 anos de idade; ela estava a poucos meses dos 37. Ele era alto, levemente calvo e convictamente barbudo. Possuía aquela famosa e pouco formosa, mas deveras proeminente barriguinha, o que não era bem o caso, mas fica assim, por compaixão do narrador. Nem um pouco desleixado, nem tampouco vaidoso; educado e sempre gentil. Alguns dos amigos mais chegados não sabiam como se entendiam tão bem. Ela, uma bela mulher que, por sinal, adorava desfilar seu corpo naturalmente, exceto pelas caminhadas, belo e conservado; vaidosa e insegura, embora mais para um do que para outro.

Há alguns meses se encontra demasiado desconfiada. Ele havia emagrecido, sem dietas. Chegava mais tarde que o comum, e dizia estar sempre num período de maior labuta no trabalho. De fato, estava. Vai saber mais aonde... Ainda assim, sua intuição, tão cara e feminina, cismava em lhe tentar, em lhe dizer sobre uma outra. De fato, havia. Triste ela ficou, porém não arrasada. Decidiu, antes de deprimir, que iria lutar pelo que era seu, ainda que fosse apenas para desdenhar e sentir o sabor agridoce da vingança. Bem, ela mal saberia em que iria desaguar tudo isso. Todavia ele devia deseja-la novamente e somente a ela, a quem de direito, ninguém mais.

Desta vez teve a vã certeza: estava envelhecendo, ficando feia e acabada, além dos quilos a mais, embora nada disso se desse a ver. Almejou outra vez ser linda, como aos 20, apaixonante e sedutora, apenas para ele. Por hoje bastaria. Matriculou-se na academia, onde assiduamente se exercitava de 2 a 3 horas diárias. Fez uso das despesas e abalou as economias domésticas, o que lhes sobejava. Esticou a pele, renovou os seios, talhou a cintura. Ficou nova, ao menos para ela. De certo, mais do que nunca os homens a cobiçaram, as mulheres a invejaram, embora sempre compareçam as exceções, as quais nunca são tão poucas assim. Enfim, o importante é que sua auto-estima inflou, mas nem tanto. Seu marido, justo ele, quase nada observou. Claro que notou e até mesmo elogiou, mesmo que quase da boca para fora. Reforçara o quanto achou desnecessário, justo ela, agraciadamente formosa.

Mas nada daquilo lhe descia o estômago. Após 3 dias buscando ratificar e, assim, legitimar a traição, usando de toda discrição ela o viu chegar as portas de um motel. Esperou um tanto, aguardando quem sairia do táxi que viera ao seu encontro. Se alguém ali estivesse, ela poderia apostar o quanto fosse que se tratava de uma menina, bem ninfeta, daquelas que o tempo e o corpo não retornam. Ela perderia. Para sua decepção, ou quase, mas definitivamente para sua confusão, a outra certamente jamais havia retirado as rugas, nem sequer, com todo aquele peso, adentrado uma academia, nem algo semelhante, muito menos se deteve em alguma revista de moda. Ali, os amantes se beijaram, rapidamente, em parte pela discrição, em parte pela pressa de chegar ao quarto e nas horas porvir, se perder. Ela, do lado de cá da rua, já estava.


Bruno Costa

22 comentários:

Rafaela Bezerra disse...

Obrigada pelo comentário no meu, Bruno.
É muito gratificante saber que o que escrevo agrada alguns. Me estimula muito a continuar escrevendo.

Gostei muito do teu também. Vou seguir.

Unknown disse...

bela crônica...texto muito interessante...bom de se ler...

William Koppe disse...

me parece que ela mal percebia que, pela sua vaidade, perdia para si mesma

já linkei no twitter

todavia, mas, porém... disse...

Tantas histórias paralelas e vividas podem ser comparadas com esse texto.

Um abraço !

Angélica Nunes disse...

Adorei a crônica! Continue assim!

Fábio Flora disse...

Como disse o Coisa Ruim, vivido por Al Pacino em "Advogado do diabo", a vaidade é, definitivamente, meu pecado favorito. Abraços e sucesso com o blog!

Tati disse...

Um homem que valorizava o presente e não a caixa, uma mulher que queria ser uma embalagem vazia. São tantos assim que encontramos por aí, né?
Beijos.

Mariana. disse...

Seu conto ficou maravilhoso! Além disso, passou uma ideia muito interessante: Ter apenas a beleza de nada vale.
Você escreve muito bem, realmente adorei.

CAMILA de Araujo disse...

Conto genial, gostoso de ler.

João disse...

Vaidade serve mais para angustiar que para qualquer outra coisa.
Bom texto!

Unknown disse...

Muito bom;... Parabéns!

Leonardo disse...

Como se apenas a beleza fosse suficiente para manter um relacionamento huahuahua Ótimo texto parabéns. Difícil eu ler blogs com texto até o final geralmente eu abro são texto chatos eu já fecho e praticamente dou ctrl+C ctrl+v nos comentários anteriores ... O seu eu li o texto até o fim

Monique disse...

Seus textos sempre maravilhosos de se ler e principalmente nos fazendo refletir sobre os valores da vida.
Acho q no mundo de hj existe uma "ditadura" em relação a beleza, onde muitas pessoas se desesperam se não se enquadram no perfil que a sociedade impõe. Acabam por esquecer que o mais importante está dentro de nós...nossas raízes, nossos valores, nossos princípios. É isso que define a nossa beleza e é o q deve ser valorizado.
Parabéns!

Anônimo disse...

nosssa! muito bom seu texto.
Bem escrito, fácil de entender e com uma boa história.
Parabéns!!
beijos

Douglas Lourenço disse...

é acabou sendo em vão todo o esforço dela sendo q o marido saia com alguem q nao era certamente o esteriotipo de beleza do qual ela achava q agradaria se tbm o fosse...parabens pelo texto.

Ariane disse...

Muito boa sua história e com certeza é caso real... acontece muito por aí!
Parabéns pelo blog.
Abraço.

Lívia disse...

Queridos,
Que preciosidade de blog! Encantei-me e me identiquei desde o princípio, com o nome e a proposta. Os textos são primorosos!São belíssimos os atravessamentos com áreas como literatura, psicologia, música, sociologia e museulogia.
Vivemos na era da modernidade líquida, como tão bem analisa Bauman. Nadar contra a correnteza, é uma atitude em vão. Precisamos é buscar estratégias que não nos deixem afogar diante da força da correnteza e nos possibilitem nadar da forma mais confortável e consciente possível. Este blog, com tanta sensibilidade, reflexão e irreverência, é um bela estratégia, tanto para vocês, quanto para nós leitores.
Grande abraço e muitas inspirações,
Lívia

Tatiane disse...

Homens...
Nada nunca é suficiente. O bom é fazer tudo que lhe faz bem sem pensar muito neles.. qdo nós nos achamos interessante, o mundo responde com o mesmo entusiasmo. Qto mais nos ocupamos de coisas nossas , mas eles querem estar conosco. Como sempre digo: a beleza seduz, as atitudes conquistam.

Obrigada pela sua ilustre presença no meu blog viu B? Vc sempre faz a diferença.
;)

Tatiane disse...

Obrigada pelos parabéns Bruno
;)

Victor Piacenti disse...

vc escreve muito bem cara!

muito obrigado por comentar no meu blog, estou te seguindo, me segue tb??

abraço

Anônimo disse...

Muito bom o conto, expõe de forma interessante a questão da vaidade e dos padroes de beleza estabelecidos ...

nara disse...

quanto mais se tem, mais se quer, né... Embora eu tenha que adimitir, que a vaidade é o pecado que mais me convence e me faz cair em tentação, essa foi uma boa retratação do que se acontece hoje em dia. Parabéns!