Abriu a primeira gaveta da cômoda ao lado da cama de seu quarto. Encontrava-se já fechada havia algum tempo, não muito. Ali, o título do livro lhe anuncia a salvação possível. Não era a bíblia, o talmude ou o alcorão, tampouco um livro do darma budista. Estes andam por demais ultrapassados na era tecnicista, embora os usos ultrapassem os tempos, são as contradições da história. Recebera no último natal, época em que o leu vorazmente, ou como se diz no popular, “devorou-o”. Apesar disso, o livro agora lhe parece inteiramente estranho, carregando consigo um conteúdo desconhecido. Sabemos como acabam empoeirados os títulos outrora cobiçados, mas este em especial trouxera ares de esperança quando Francisco pedira no amigo-oculto do trabalho. José, seu primo, aconselhara a leitura após ter superado um período delicado com sua ajuda, ou auto-ajuda e, claro, a do psicoterapeuta. Na verdade, este último foi quem indicou a leitura. Porém, pareceu-lhe não fazer mais o mesmo sentido. Afinal, essas coisas não costumam retornar, a cada dia o seu mal e assim vamos seguindo, mesmo quando não gostamos de aceitar. De certo que a vida seja marcada pelo que deixamos de ser no tempo, não o contrário.
Talvez fosse mais recomendável procurar por outro especialista. Francisco já se encontrava cético quanto ao poder de sua alimentação balanceada, já desconfia do prometido bem-estar cujos efeitos revigorantes ainda não viu. Os exercícios matutinos sem dúvida são bons, mas seu corpo demanda por mais, porém nada que uma série mais alongada possa dar conta. Então, um psiquiatra, quem sabe? Talvez possua algum distúrbio como o de Laura, sua ex-mulher. Ou então uma síndrome pouco explorada pelas ciências humanas, como a de seu já falecido tio Jarbas. Quem sabe ainda um transtorno como o da vizinha Manuela. Até mesmo poderia ser o “de cujus” da TDAH de seu filho, o infeliz herdeiro. Mal sabe Francisco quantas mais não são as multiplicações das páginas dos compêndios psiquiátricos e psicológicos. Que ele não leia a respeito das estimativas. “Mais fácil para um bom diagnóstico?”, perguntou ao vento, “mais difícil alcançar a normalidade”, ponderou surpreso com o lugar ao qual o pensamento o levara.
“Há de existir uma trilha sem nome, sem fim”. Francisco decidiu que era hora de dar um tempo da ordem desordenada de sua vida. Era hora de se deixar levar, errar sem destino. Tatear sem pistas, sem objetivo, sem projeto. Andar sobre as vagas, flutuar. “O caminho da felicidade é o que nos impossibilita de alcançá-la, ou melhor, de criá-la”, conjecturou. Entre prantos e sorrisos, Francisco fechou a gaveta da cômoda.
Bruno Costa
34 comentários:
Nada como a normalidade vivida e não apenas pensada como algo natural pra nos aprisionar no círculo vicioso da interminável busca (consumo) por messias dos mais diversos tipos.
Ah sei la cara eu achei que o texto ficou confuso e não chegou a lugar algum...rs
O objetivo era qual? Questionar se nossos caminhos, todos, já foram explorados? Falar sobre a loucura? Apenas hipoteses?
Não sei...to pensando.
abçs
Ainda to refletindo sobre o que o texto tem a passar!
poxa, rotina bem contada hein mano! curti! mas meio confusa [nada que uma meditada não resolva! kkk]
mas li outros abaixo aqui e gostei!
vou vir aqui mais vezes!
passa lá no meu blog dpois mano!
http://marotissimojuiz.blogspot.com/
abraço!
me lembrou Clarice Lispector, a escrita fantástica, uma coisa simples vira uma tempestade... rsrs
Gostei bantante do blog...
Dá uma passadinha no G7 Notícias: http://g7ceara.blogspot.com
“Mais fácil para um bom diagnóstico?”, perguntou ao vento, “mais difícil alcançar a normalidade”, ponderou surpreso com o lugar ao qual o pensamento o levara.
Acho que todo mundo vai passar, já passou ou está passando por uma fase assim confusa como a do Francisco.
Gostei muito do texto
Não prescisas seres claro prescisas apenas dizer.
O caminho da felicidade está na forma que vemos a vida e em como aproveitamos as oportunidades que ela nos presenteia. Ver em cada novo dia uma chance de recomeçar, é uma boa sacada ;)
www.nicellealmeida.blogpsot.com
Muito bom o texto... ser feliz... a busca constante do ser humano.
Todos alcançam... é cmo diz a musica "quem acredita sempre alcança"
Vizite
http://paginazabertas.blogspot.com/
um dia não seremos mais...jamais.
E assim criam-se as memórias...
www.preguicaalheia.blogspot.com
Parabéns pelo blog.. entra no meu e se gostar pode seguir!!
ps.: estou te seguindo!
Abraço,
P.A.
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www.preguicaalheia.blogspot.com
paravens pelo blogo texto e bom mais nao li todo
Toda ordem vem acompanhada com uma desordem. A felicidade está ali... quase imperceptível. A gente acha que ela é espetáculo e às vezes a deixa escorregar entre os dedos ou numa fala descuidada.
Belo Conto!
Gostei principalmente na parte que ele fala dos vários disturbios de pessoas próximas. É algo comum hoje em dia não? Todos tão estressados, tão cansados da rotina que acabam assim. Infelicidade, vazio, precisamos de algo novo às vezes. Ótimo texto!
http://entrepalavrasenotas.blogspot.com - Li, comentei e segui, retribui?
Ué, mas e a matemática? Está ultrapassada?
Crônica é um gênero que, constantemente se faz atual a qualquer época (claro que depende do assunto abordado).
Shakespeare ainda é lido e apreciado.
Os mistérios das pirâmides do Egito ainda encantam e intrigam.
O amor sempre existiu (já que Deus é amor).
Antigos ditados ainda são usados hoje.
Nem tudo o que é antigo está ultrapassado!
;)
A vida não é nada sem os impecilios... sem eles a vida nãotem OBJETIVIDADE...
fases confusas todos nós passamos, esse texto nos faz refletir um pouco. As vezes precisamos dar um tempo na vida desordenada e se deixar levar, de repente, a vida nos leva a algo melhor e tudo se resolve, é só uma questão de tempo.
se quiser, acesse meu blog http://artegrotesca.blogspot.com
LOL muito bom o texto!Rotina bem contada!
Me visita??http://www.gatobebadowebs.blogspot.com
Acho q muita gente se sente ás vezes assim como ele.
Nunca gostei desses livros de auto-ajuda. Na verdade nunca li nenhum, não me interessam. O moço do conto fez certinho em fechar a gaveta.
Putz, apesar de ser taxativamente contra livros de auto ajuda (que me pareceu ser no caso do Francisco) eu fiquei torcendo pro sujeito encontrar alguma coisa ou no livro ou alguma lembranca relacionada a brincadeira de amigo oculto que fosse catapultá-lo a al gum outro tipo de descoberta. Não é uma crítica, eu que viajei, rsrsrs. Aliás, eu li duas vezes procurando ganchos, até sacar a sua estrutura de escrita. Abs!!
Olha,
pelo que eu entendi, em alguns paragragos ele se se recupera de alguma coisa, psicologica, da qual estava se tratando... e no final segue sua vida... Tudo muito rápido, na realidade não é assim.
Você escreve muito bem, o ultimo paragrado faz refletir.
Beijo
Bem para início gostei do nome do blog soa assim como um meio caminho...um quase lugar. Então notei que além de um bom título o blog tbm tem conteúdo(coisa rara neste meio). seu texto lembra muito divagações filosóficas atuais. Bom para pensar.
www.letraslitteratura.blogspot.com
Esse tal caminho para a felicidade é trilhado a cada dia e, algumas vezes, precisamos até mesmo voltar um pouco para reencontrá-lo.
Sobre o post, já dei a minha opinião. Vim somente te desejar um bom rstante de dia... =)
Me visita ;)
www.nicellealmeida.blogspot.com
muito bom seu texto e seu blog!
gostei muito dessa frase:
Francisco decidiu que era hora de dar um tempo da ordem desordenada de sua vida. Era hora de se deixar levar, errar sem destino. Tatear sem pistas, sem objetivo, sem projeto.
Parabens!
Passa lá no meu blog pra visitar.
http://amansim.blogspot.com/
Cara tu escreve muito bem !!
Abraços,
Marcos
http://marcosilustra.blogspot.com
Adorei!
Muito bem escrito, Bruno. Meus parabéns!
[]'s
Ah, já falei que o texto é bom, mas relendo-o agora tenho que lhe falar só mais uma coisinha:
A Biblia nunca vai estar ultrapassada!
Cada louco com sua loucura, não é mesmo?
No fim das contas, o mundo todo precisa de terapeutas, inclusive os próprios.
Um bom texto para refletir!
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