Todos os domingos eram dias de virtuosa caridade. Após a missa, reuniam-se os padres, as freiras e os coroinhas, para realizarem as visitas. Escolhiam uma comunidade, possivelmente carente no que tange às finanças, mas que não fica bem nos dias que se chamam hoje, chamarmos de “favela”. Embora adornados os batismos, as condições de vida e sobrevida se conservam. Entendido o que foi dito, doravante continuemos.
Tudo pronto. O carro encarregado de transportar as cestas básicas que salvam o corpo, as roupas e os cobertores que alimentam a pele, e as boas-novas que aquecem as almas, já havia chegado. Foram assim os da paróquia para mais um evangelismo dominical. Lá, uns para um lado, outros para outro, alguns ainda para um terceiro. É que nestes lugares não faltam entradas outras, novos becos, como um labirinto desmedido para os do asfalto; uma cartografia lida para os de dentro.
Numa destas casas qualquer, bateu frei Tomás. Na verdade não bateu, por medo de derrubar a porta moribunda, causando assim um constrangimento logo na entrada. Chamou por palmas até ser atendido por uma mulher que, surpresa como quem espera algo demasiado aguardado, pediu que entrasse. A ordem era não adentrar sozinho em casa de mulher sozinha, sem sinal de presença masculina. Entretanto, talvez pelo olhar de súplica daquela mulher, ele cedeu. Esforçou-se ela para o deixar acomodado em seu humilde lar, enquanto apanhava a cesta com as roupas, e logo as levou para dentro. Conversaram.
Frei Tomás inspirou profundamente, encheu os pulmões de ar, buscando sentido, em desalento pela história de vida da moça. Não poderia saber o que viria. Ainda jovem, apenas 26 anos, embora não tenha vivido menos de 35. Seus 4 filhos não estavam em casa. Foi viúva uma vez aos 19. Abandonada outra vez, aos 25, mas não por motivo de morte. Após a prece, como uma palavra de consolo, o frei lhe disse que tudo iria melhorar. Então, ela pediu que o fizesse.
Desatou o laço que amarrava seu vestido. Despiu-se. Não era bela. Não havia formosura em seu corpo. O frei emudeceu. Pálido e avermelhado, tudo em perfeita sincronia. Ela queixou-se de uma vida sem prazeres e disse: “Nunca tive um homem tão bem apanhado em minha frente. Saudável, forte, bonito. Se veio trazer algo bom... que seja pleno”. Quantos sentimentos não percorreram a pele deste virgem frei... mas apenas afetos. Nada na consciência. Nenhuma explicação. Silenciado, por não haver o que dizer. Entendendo por consentimento o que cala, ela se aproximou, pegou sua mão e a pressionou contra os seios. Beijou-o. Convidativa, caminhou em direção ao quarto, deitando-se.
Muitas idéias podem se fazer deste momento. Carne fraca, pecado. A elaboração tardia de um Édipo, ou até mesmo uma vingança à castração psicanalítica. Proveito próprio. Filantropia. Enfim, várias teses e antíteses que não chegariam a qualquer síntese. Vício da razão, essa nossa tara em explicar tudo cartesianamente.
Fizeram amor. Ou, para fazer jus à linguagem sacra, ele a possuiu.
Obs.: Inspirado numa história real.
Bruno Costa
Tudo pronto. O carro encarregado de transportar as cestas básicas que salvam o corpo, as roupas e os cobertores que alimentam a pele, e as boas-novas que aquecem as almas, já havia chegado. Foram assim os da paróquia para mais um evangelismo dominical. Lá, uns para um lado, outros para outro, alguns ainda para um terceiro. É que nestes lugares não faltam entradas outras, novos becos, como um labirinto desmedido para os do asfalto; uma cartografia lida para os de dentro.
Numa destas casas qualquer, bateu frei Tomás. Na verdade não bateu, por medo de derrubar a porta moribunda, causando assim um constrangimento logo na entrada. Chamou por palmas até ser atendido por uma mulher que, surpresa como quem espera algo demasiado aguardado, pediu que entrasse. A ordem era não adentrar sozinho em casa de mulher sozinha, sem sinal de presença masculina. Entretanto, talvez pelo olhar de súplica daquela mulher, ele cedeu. Esforçou-se ela para o deixar acomodado em seu humilde lar, enquanto apanhava a cesta com as roupas, e logo as levou para dentro. Conversaram.
Frei Tomás inspirou profundamente, encheu os pulmões de ar, buscando sentido, em desalento pela história de vida da moça. Não poderia saber o que viria. Ainda jovem, apenas 26 anos, embora não tenha vivido menos de 35. Seus 4 filhos não estavam em casa. Foi viúva uma vez aos 19. Abandonada outra vez, aos 25, mas não por motivo de morte. Após a prece, como uma palavra de consolo, o frei lhe disse que tudo iria melhorar. Então, ela pediu que o fizesse.
Desatou o laço que amarrava seu vestido. Despiu-se. Não era bela. Não havia formosura em seu corpo. O frei emudeceu. Pálido e avermelhado, tudo em perfeita sincronia. Ela queixou-se de uma vida sem prazeres e disse: “Nunca tive um homem tão bem apanhado em minha frente. Saudável, forte, bonito. Se veio trazer algo bom... que seja pleno”. Quantos sentimentos não percorreram a pele deste virgem frei... mas apenas afetos. Nada na consciência. Nenhuma explicação. Silenciado, por não haver o que dizer. Entendendo por consentimento o que cala, ela se aproximou, pegou sua mão e a pressionou contra os seios. Beijou-o. Convidativa, caminhou em direção ao quarto, deitando-se.
Muitas idéias podem se fazer deste momento. Carne fraca, pecado. A elaboração tardia de um Édipo, ou até mesmo uma vingança à castração psicanalítica. Proveito próprio. Filantropia. Enfim, várias teses e antíteses que não chegariam a qualquer síntese. Vício da razão, essa nossa tara em explicar tudo cartesianamente.
Fizeram amor. Ou, para fazer jus à linguagem sacra, ele a possuiu.
Obs.: Inspirado numa história real.
Bruno Costa
31 comentários:
adorei...é o segundo que leio e já vi que vou precisar ler os que já foram postados, parabens aos criadores do blog e espero que com tempo possa contribuir para que novas viagens se realizem através deste espaço...
beijos
Isso é uma verdade!
Por que teimamos escondê-la, não é verdade?
Satisfaçam-se os desejos desde que necessitados sejam.
abs,
seuanonimo.blogspot.com
Adorei, muito bom mesmo.
Bem interssante...
principalmente por deixar no ar...e não julgar com sua opinião o que foi tal ato além da luxúria...fica na opinião de cada um...
Muito bom!
Interessante seu nicho.
To seguindo.
Um abraço!
Quando quiser rir um pouco, acessa o RFPostando:
http://rfpostando.blogspot.com
mas onde estava a luxúria afinal? na mulher que desejou aquele homem em seu hábito? no homem que sentiu o calor subir por entre suas pernas e direcionou-o ao seu desejo? concidentemente ao ler esse texto ouço isabella taviani - luxúria
"Eu quero é derrapar
Nas curvas do seu corpo
Surpreender seus movimentos
Virar o jogo
Quero beber, o que dele
Escorre pela pele
E nunca mais esfriar
Minha febre..."
ah .. vou mostrar sua história pro dono dela hehe
interessaante. Gostei :*
Bela história!
Nem sempre é preciso procurar resposta exata para os atos. Conforme ressaltou "(...) essa nossa tara em explicar tudo cartesianamente" as vezes nos distancia do que se é. Sinta, busque, reflita, paralise ou não. Bjs!
Inspirado em uma história real? Bom era saber quem te contou uahuuhahua
Parabéns..
Possuiu-me!
http://euseocotidiano.blogspot.com/
poooooo, inspirado em uma história real??? hahahaha
Como sempre tenho dito, sua série é um espetáculo, sempre ótimos textos! :)
Esse não foi o meu preferido mas teve o melhor parágrafo de todos, aquele do "Muitas ideias...". Pô, sensacional, hein?
É isso aí, pecado, instinto, necessidade, amor, enfim... chamem do nome do que quiser, criem as teses que quiser, a verdade é que quando tratamos desse assunto não existe uma verdade, quão menos uma síntese, como vc muito bem disse!
http://songsweetsong.blogspot.com/
4 filhos que não estavam em casa? Viúva aos 19? Abandonada aos 25? Não se pode confiar nas desgraças de uma mulher, sobretudo quando são artifícios para encontrar "amor" - na prática, uma foda pueril e efêmera, com quem for; se for um padre ainda melhor, pois além da aridez latente supre-se uma necessidade fetichista...
Não é inspirado numa só história real. É em várias outras também.
Saudações!
Texto fantástico!
E convidativo ao restante da série!
É coisa natural do ser humano. Discordo da regra hipócrita que priva um homem dos prazeres da vida. Não que defenda a vulgaridade, longe de mim.
Parabéns pelo blog e pelos textos! Vejo que dá atenção ao que faz.
Um beijo.
É bem escrito e sutil, delicadamente vai apresentando a história e envolvendo aos poucos!
Visite:http://pontapedepartida.blogspot.com/
Parece história real
muito bom!!!
Ótimo texto, muito bem elaborado e escrito. Gostoso de ser lido, muito embora sem alguma explicação específica me chamou atenção o trecho que diz: "Escolhiam uma comunidade, possivelmente carente no que tange às finanças, mas que não fica bem nos dias que se chamam hoje, chamarmos de “favela”." Será que por trás dessa superficialidade ao chamar negros de afrodescendentes e favelas de comunidades não está uma solução para desmascarar a hipocrisia que nos assola?
Boa Noite
www.catarseonline.blogspot.com
Luxuria, o mais delicioso dos 7 pecados (6)
Muito bom mas esse texto, já havia lido o anterior.
Parabéns!!
A verdade é que o desejo vem sem nem ao menos esperarmos o momento nem por quem o sentiremos.
E como tudo na vida sempre desejamos que tenha uma explicação, a carne fraca ou não sente prazer e nele a luxúria se faz presente, até mesmo pelos nossos sacerdotes e outros cristãos e pessoas em geral.
Seu texto me remete um romance do Eça de Queiroz chamado "O Crime do Padre Amaro" que tem a temática da luxúria no meio clerical. Se ainda não leu, fica a dica. Vale a pena.
Para mim é bastante impactante ler algo assim. Acho que você conseguiu aquilo que, talvez, tenha se proposto fazer; provocou emoções. Acho que essa é a beleza do seu texto. Choca, faz refletir, aguça o senso crítico, inquieta, provoca...
Um abraço.
pecado nada
nada é pecado!
Boa, boa!
Segunda vez que to passando por aqui!
GRande abraço!
criatividade falar dos sete pecados capitais *O*
mto bom o texto!!! =]
hehe
bjos
leticia
=]
http://www.novalexandrianet.blogspot.com/
Respondendo ao seu comentário:
Eu não me baseio na psicologia para escrever as coisas do me blog (não conscientemente ^^), mas enfim vc está certo, tem todo mundo deve ser amiguinho ninguem, contando q se sinta bm, e que não seja cruel com os outros, talvez eu simplesmente tenha uma filosofia barata de vida, talvez eu seja um Dom Quixote que ainda não percebeu que a idade medieval passou...Mas não abaixarei minha espada ^^, enquanto eu acreditar em algumas coisas eu vou escrever no meu blog, obrigado seu comentário foi um banho de água fria, porém me alertou...^^
Obrigada pela visita e volte sempre
Muito bem escrito, bem articulado.Parabéns ...
Muito bom! Vc escreve pra caramba!!
Olá, Bruno.
Em resposta ao comentário que você deixou lá no Mulherices - não, não é só para mulheres e o texto é totalmente livre. Pode ser sobre o que você quiser.
O prazo foi extendido até sexta-feira. Vem participar.
Abraços.
Equipe Mulherices
Espero mesmo que meu romance tenha continuidade e agradeço..
Gostei do texto, da forma que tratou da luxúria, assunto delicado e por muitas vezes escondido.. É gostei.
MEU DEUS, muito bom! "como um labirinto desmedido para os do asfalto; uma cartografia lida para os de dentro."
estou seguindo e obrigada pelo comentario no meu blog.
Um dos pecados mais interessantes
acredito que seja o pior dos pecados na minha concepcao!!
A luxúria te sega para os verdadeiros prazeres do mundo: AS COISAS SIMPLES!!!
Grande abraço :D
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